Confira a Crônica da semana da Academia de Letras dos Campos Gerais: "Brabeza"
Nascer e crescer em Palmeira é um privilégio de uma parcela da população dos Campos Gerais não muito ampla. Modestamente, admito ser parte destes, ou diria melhor, orgulhosamente me identifico palmeirense.
E, claro, tenho também minhas histórias, as histórias de um moleque “brabo”, que nasceu em casa, tinha a honra de vizinhar com os Kardush, Dona Linda e seu Assad, poder caminhar tranquilamente até a Praça Marechal Floriano, ou ir sozinho, com 5 ou 6 anos, até o pré-primário do Colégio das Freiras, que também nos vizinhava. Nos fundos de casa, além do pé de ariticum, já proseado aqui, a Rádio Ypiranga nos fornecia gratuitamente suas melodias e noticiários.
Dentre outras memórias, despertas pelo desejo de “cronicar”, lembro-me de ir até o Seu Paulo, o barbeiro que sempre cortava os cabelos masculinos de nossa casa, subindo a Conceição, quase na porta da rádio, vestido com uma camiseta do Coritiba F. C. Ao chegar lá, minha mãe, como de hábito pede a ele um corte bem caprichado, bem curto, “pra aproveitar bem o dinheiro, hein seu Paulo”. Ele olha para mim e me pergunta: “então, você é coxa branca?”. O moleque, muito “brabo” mostra a perna, e responde beiçudo: “eu não sou coxa branca...”. Deveria eu ter cerca de quatro ou cinco anos, e não fazia a mínima ideia do significado desta alcunha.
Minha mãe conta ainda que, talvez com um pouco menos idade, esse moleque, após ser repreendido em casa, alguma travessura certamente, saiu emburrado, com as mãos para trás e tomou o rumo Conceição acima, não dando bola para ninguém. Ela me seguiu, e, divertindo-se com seu rebento, acompanhou esta aventura. Relata que ao passar pelo Seu Paulo, que sempre “mexia” comigo, não me importei. Segui firme em meu propósito de “fugir de casa”. Passo a rádio, caminho, caminho, caminho, passo a Agottani, continuo até chegar em frente ao Cemitério. Naquela época, a Conceição não era calçadão como hoje. Bem, lá eu paro, provavelmente cansado, e já com o coração mais calmo, olho para minha mãe e falo: “mãe, vamos voltar para casa?” Ela me toma pela mão, e descemos a Conceição novamente.
Minhas irmãs sempre reclamaram que as botas ortopédicas que me obrigavam a usar para corrigir o “pé chato”, eram verdadeiras armas em meus pés. Os hematomas nas canelas delas, quase sempre eram consequências de um moleque bem “brabo”.
Não era fácil esse moleque!
Texto de autoria de Mário Francisco Oberst Pavelec, técnico em agropecuária, natural de Palmeira, residente em Ponta Grossa, escrito no âmbito do projeto Crônicas dos Campos Gerais da Academia de Letras dos Campos Gerais
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