Mais que celebrações, é necessário e urgente que pensemos nas condições da educação de nosso país e a importância simbólica de nossos professores
Celebramos no dia 15 de outubro o Dia do Professor, a data é alusiva ao Decreto publicado por Dom Pedro I em 1827 que instituiu o Ensino Elementar no Brasil, com a consequente regulamentação dos conteúdos a serem ministrados nas escolas, mas somente em 1947 esse dia foi transformado em feriado, quando o professor Salomão Becker sugeriu uma pausa no calendário escolar para celebração de um dia especial aos professores no Estado de São Paulo.
Somente em 1963 o Dia do Professor passou a ser comemorado em todo o território nacional, quando o então Presidente João Goulart oficializou a data através do Decreto Federal 52.682. Desde então, há um dia especialmente voltado para a celebração da importância dos professores brasileiros, entretanto, mais do que ter o Dia o Professor, é fundamental que os nossos professores sejam valorados de fato no cotidiano, nas condições de trabalho e não apenas em uma data no calendário.
Mais que celebrações, é necessário e urgente que pensemos nas condições da educação de nosso país e a importância simbólica de nossos professores. Recordar é viver, por essa razão, tomemos a realidade como desafio do momento, como diz a música de Geraldo Vandré: “quem espera faz a hora, não espera acontecer”; por essa razão, transformemos o dia 15 de Outubro em um grito ensurdecedor em defesa da educação e de nossos professores.
No Brasil há mais de 2 milhões de professores espalhados em quase 185 mil escolas; as condições reais de trabalho não nos leva a comemorações, ao contrário, somos apresentados a uma triste realidade que devemos encarar com o desafio e compromisso de superação aos problemas estruturais da educação brasileira.
Não há o que se comemorar quando os dados do Censo Escolar de 2017 revelaram que mais de 58% das escolas de Ensino Fundamental não possuem rede esgoto; os professores dessas escolas merecem mais que felicitações, a eles, devem ser entregue condições dignas para o trabalho.
Não há o que comemorar quando 11% das escolas do país com a maior reserva hídrica do planeta não oferece água potável aos seus alunos, professores e funcionários.
Não há o que comemorar quando que mais de 65% das escolas não possuem acesso à internet. A pandemia do novo coronavírus demonstrou o fosso da desigualdade que assola o nosso Brasil, a ausência de dispositivos digitais e acesso à internet afetaram em absoluto os alunos das escolas públicas com prejuízos quase que irreparáveis e seus professores resistiram a cada dia dessa pandemia.
Não há o que comemorar quando 53% das escolas de Ensino Fundamental não dispõem de laboratório de informática e mais de 45% não ofertam aos seus alunos e professores bibliotecas ou sala de leitura.
Não há o que comemorar quando encaramos a dura realidade que mais de 55% dos municípios não cumprem o Piso Nacional Salarial Docente de apenas R$ 2.886,24. Os nossos professores são mal pagos, por isso acumulam múltiplas jornadas para o sustento básico da família. Não há justificativa que me convença o porquê da oitava maior economia do planeta remunerar tão mal os seus professores, a questão aqui não é corporativismo, mas sim, a absoluta ausência de importância simbólica da educação e de nossos professores no decorrer dos séculos.
Nossos professores devem ganhar muito bem, o suficiente para a dedicação exclusiva de apenas uma jornada de trabalho, o necessário para uma vida digna e confortável, mas não é isso que testemunhamos, os nossos professores complementam a renda com venda de perfumaria, acessórios ou atuam como motoristas de aplicativos, triplicam a jornada de trabalho e compram dos próprios vencimentos os materiais pedagógicos para a escola. Não há disponíveis as condições mínimas de trabalho e nossos professores entregam em absoluto a uma estrutura desigual que assola as nossas crianças e nosso país.
Precisamos muito mais que felicitações, é necessário que consigamos ações concretas de qualidade de trabalho, conforto, segurança e rentabilidade. Mais que homenagens vazias em condições caóticas, o Dia do Professor deve traduzir o enfrentamento da realidade de trabalho e a contínua luta de superação ao caos que nos assola.
A pandemia do coronavírus e a consequente interrupção das aulas presenciais demonstraram mais uma vez a bravura de nossos professores, entretanto, é atordoador saber que milhões de nossos alunos em pleno século XXI vivem nas condições descritas em 1993 pelos Racionais MC’S na música Homem na Estrada: “molecada sem futuro eu já consigo ver, só à escola pra comer apenas nada mais, como é que vão aprender sem incentivo de alguém, sem respeito, sem saúde e sem paz”, a esperança dessas crianças está em nossos professores e com eles, por eles e para eles devemos lutar.
Que as felicitações acompanhem a defesa da luta por condições reais de trabalho, remuneração adequada, infraestrutura digna e valorização da carreira. Que acompanhem também a solidariedade aos mais de dois milhões de brasileiros que fazem esse país funcionar e são a certeza da esperança de dia melhores.
Não sabemos como será o dia de amanhã, mas temos certo que se queremos de fato ser um dia uma grande e importante nação, o caminho deve começar na escola, na sala de aula e com a valorização efetiva de nossos professores no cotidiano, não apenas com felicitações no dia 15 de outubro.
Parabéns a todos os meus colegas professores pela resistência, fé e esperança.
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