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Zero Oito

Confira a Crônica da semana da Academia de Letras dos Campos Gerais: "Zero Oito"


Uma cidade como Ponta Grossa, em seus intensos e longos anos de história, já produziu vários casos pitorescos. Cada morador sempre tem um para contar. Alguns desses casos são quase tão antigos quanto a cidade. Foram sendo contados de forma empírica através de gerações pelos avós, pais, tios e se perpetuaram, talvez com algum exagero. No tempo em que uma visita a parentes ou amigos era feita essencialmente para conversar, sem televisão ou celular que desviassem ou empobrecessem o assunto, os casos eram temas recorrentes e interessantes. Variados, eles transitavam de boca em boca. Um dos mais comentados envolvia o Zero Oito, um codinome que ninguém sabe de onde surgiu. Era um homem muito alto e demasiadamente forte segundo seus contemporâneos.


Praticava luta livre e invariavelmente consagrava-se vencedor pela força de seus golpes nos oponentes que ousavam desafiá-lo. Tornou-se uma figura folclórica e suas lutas lotavam os locais onde eram realizadas. Outra figura lendária da cidade era a temida e invencível Mulher Gorila, lutadora que se apresentava no Circo Nhô Bastião com tremendo sucesso. Suas “voadoras” levavam os adversários à lona em segundos. Mesmo assim ela perdeu uma luta para o Zero Oito para delírio do público.


Um acontecimento dentro dos limites do quartel, quando o lutador servia ao exército, ficou marcado no imaginário da população. Num treinamento de rotina, Zero Oito estava encarregado de levar um burro de um ponto a outro. Era inverno, havia geado à noite e na caminhada o burro empacou, fincou as patas dianteiras no solo gelado e não saía do lugar nem por decreto. Irritado com a situação, já cansado de puxá-lo, empurrá-lo, o soldado tentou o último recurso para que o animal andasse. Deu um tapa na cara do burro que tombou morto com somente um golpe.


Depois da baixa do quartel, trabalhou no matadouro municipal, na matança, atividade que se adequava à sua personalidade. Em família levava uma vida normal. Não esperava, no entanto, que o destino lhe pregasse uma peça. Por volta do final dos anos 60, para reparar a antena de sua TV que não estava com bom sinal subiu no telhado da casa. Inadvertidamente esbarrou num fio de alta-tensão e caiu ao solo, eletrocutado. Foi o fim do valente Zero Oito, sem segunda chance, assim como aconteceu com aquele animal teimoso.


Texto de autoria de Sueli Maria Buss Fernandes, professora aposentada, residente em Ponta Grossa, escrito no âmbito do projeto Crônicas dos Campos Gerais da Academia de Letras dos Campos Gerais

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