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"Rupturas" é o texto da coluna desta semana

Confira a Crônica da semana da Academia de Letras dos Campos Gerais: "Rupturas"


Fratura, ruptura, fenda, quebradura, divisão de algo em partes menores. Quantas coisas se rompem, se partem, se quebram, se dividem, produzem fendas! Se rompem objetos antigos de valor afetivo. Se rompem namoros, noivados ou casamentos cujas juras trocadas foram de união e amor eternos. Se rompem correntinhas de ouro, como aquela linda pulseira que foi meu presente de 15 anos. Se rompem cadeados num litígio por herança, apegos financeiros vis e ignóbeis. Nas relações sociais ou familiares acontecem rupturas, algumas passageiras, por mil motivos, outras irreversíveis. Se abrem fendas abissais sem a possibilidade de transpô-las. A rachadura permanece viva, machucando a memória. Em qualquer uma dessas situações há sofrimento em variados níveis, lembranças amargas, arrependimentos e tantos outros sentimentos, inclusive a dor. Dor na alma, ressentimentos, quebra de confiança.


Nasci e cresci em Ponta Grossa, percorrendo as suas, tão celebradas em cantos, versos e prosas, subidas, descidas e escadarias. Paradoxalmente, foi no piso plano do meu próprio quarto, numa escura madrugada sem lua, que inesperada queda produziu uma fratura no meu antebraço. O osso rádio se quebrou exatamente na articulação do pulso. Dor física, cicatrização mais lenta. As talas de gesso até o cotovelo, deixando à mostra somente as pontas dos dedos, são incômodas. Dormir assemelha-se a estar pregada a uma viga de madeira dura, pesada, inflexível, largada sobre a cama. De manhã, o hábito de levar as duas mãos molhadas de água fresca para lavar o rosto está temporariamente suspenso. A prece pedindo paciência é feita sem juntar as mãos. Paciência! Não há o que fazer senão aguardar que o tempo, que está sem pressa, um dia aporte no calendário e traga consigo o alívio da retirada de tão incômoda massa calcária necessária à imobilização.


Havendo presenciado tantos tipos de rupturas pelos caminhos da vida, fico aqui me perguntando: Que ruptura dói mais? Seriam mensuráveis? Quais delas poderiam ter sido evitadas? Ah, se me fosse concedido o privilégio de escolher por quais rupturas deveria atravessar! Optaria por vivenciar somente a ruptura do lacre de uma garrafa de vinho em noites de outono.


Texto de autoria de Sueli Maria Buss Fernandes, Professora aposentada, Ponta Grossa, escrito no âmbito do projeto Crônica dos Campos Gerais da Academia de Letras dos Campos Gerais.

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