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Foto do escritorRedação

Quadro negro bordô

Confira a Crônica da semana da Academia de Letras dos Campos Gerais: "Quadro negro bordô"


Na mente imaginativa das crianças residem sonhos, desejos, anelos, quimeras. Na minha infância era comum que as meninas almejassem ser professoras, fruto da convivência com suas mestras do colégio. Os meninos sonhavam ser policiais ou bombeiros que despertavam emoção e demonstravam coragem. Nas brincadeiras de polícia e ladrão todos queriam ser os heróis. Eu sonhava ser professora e para atingir esse objetivo deveria percorrer um longo caminho de estudos. Entretanto, minha primeira profissão foi aos nove anos de idade como radioatriz das novelas da Rádio Central do Paraná, uma emissora ponta-grossense. Recebia cachê no final do mês pelos capítulos dos quais participava. Estava acostumada a ter “renda” e pagar pequenas despesas com meu próprio salário. A imprescindível independência financeira já se manifestava com tão pouca idade.


Continuava atuando como atriz (até os dezessete) e frequentava o quarto ano do Grupo Escolar Júlio Teodorico. Era participativa na sala de aula da professora Sofia. Desenhava-se ali um treinamento básico para a profissão que amava. No quintal da minha casa havia uma edícula de madeira onde era armazenada a lenha que alimentava o fogão, picada a machado por meus irmãos. A mim cabia empilhá-la na parede do fundo do cômodo de nove metros quadrados. Uma pequena janela na lateral iluminava o ambiente e na frente uma providencial porta bordô. Com minha veia empreendedora vi naquele espaço um local ideal para montar uma sala de aula de reforço aos filhos dos vizinhos, do segundo ano.


O bordô da porta realçava o giz branco que trazia da escola. O hábito de receber pelo trabalho desempenhado levou-me a fazer um acordo com os pais, definindo o valor das aulas que daria aos seus filhos. Considerava-me uma profissional! Aulas de português e matemática eram bem compreendidas e suas notas saíram do vermelho. Contudo, meu maior desafio foi fazê-los decorar o nome do Governador do Paraná. No seu livro constava o nome completo, Ney Amintas de Barros Braga. A confusão acontecia pois havia na região um deputado federal chamado Braga Ramos. Meus pupilos misturavam tudo e, quando eu tentava fixar o nome do governador eles respondiam: Ney Amintas de Braga Ramos. Somente “Ney Braga” teria facilitado o ensino e a aprendizagem. Dificuldade vencida, formaram-se, e hoje um deles é bombeiro.


Texto de autoria de Sueli Maria Buss Fernandes, professora aposentada, Ponta Grossa, escrito no âmbito do projeto Crônicas dos Campos Gerais da Academia de Letras dos Campos Gerais

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